terça-feira, 3 de agosto de 2010

Tratamento de Choque

Quando eu tinha uns seis anos, meus pais que eram muito preocupados com a facilidade dos cabelos curtos e nada preocupados com a vida social da filha em fase de alfabetização, me levaram fazer um corte supermoderno para uma guriazinha: Joãozinho. Catástrofe! Enquanto todas as meninas do mundo iam pro colégio de tranças, rabinhos e chiquinhas coloridas, eu ia parecendo a Sinead O´Connor dos pampas. Para minha sorte, enquanto eles falavam em personalidade e eu pensava em como eu queria que meu cabelo fosse até a bunda ou meu apelido fosse Rapunzel, ele cresceu de novo.

Minha família (leia-se principalmente as avós) tem uma teoria bizarra de que cabelo no olho deixa a pessoa cega, teoria que, sejamos sinceros, os EMOS já fizeram o favor de derrubar. Mas como eu fui criança em um tempo em que não existia pet shop e que se esperava a música tocar no rádio para poder gravar na fita, fui vítima das tesouras insanas mais uma vez.



Férias na praia, o mulherio resolveu “dar um jeito” naquele cabelo que ia acabar com a minha vista. Fracasso! As mulheres dos anos 80 ainda não sabiam que o suporte era a invenção do demo e que nada é mais difícil de cortar do que uma franja seca. Conclusão: três meses no litoral parecendo o índio Juruna com a franja quase inexistente.


Nessas alturas, praticamente nada pior podia acontecer nos meus cabelos, que definitivamente não pareciam os da Malu Mader em Top Model, mas aconteceu. A cabeleireira da família sugeriu um corte que “todas as meninas estavam usando”. Pronto, lá saiu a Mariana parecendo o Chororó na primeira vez e um penico na segunda, logo quando inventaram o corte chanel. Em meio a tantos “acertos” em termos de estilo, coloquei um ponto final na história e deixei o cabelo crescer, crescer, crescer. Não dá pra dizer que aquela coisa sem corte era bonita, mas eu era feliz até sentir uma coceirinha estranha. Sim, aquilo estava acontecendo, era o festival do piolho na 6ª série B. Passa Escabim, Kell, pente fino, vinagre, corta de novo, mais Escabim. Ufa! Nenhuma criança aprende a lavar os cabelos direito até conhecer o pânico de ter piolhos outra vez; e isso é um ensinamento que se leva durante a vida.

Então, passado o trauma da infestação, ele cresceu, cresceu, cresceu de novo. E daí foi “a” festa: pinta de azul porque o Grêmio tá na final da Libertadores, pinta de papel crepom que sai no banho, pinta da vermelho sangue porque eu quero ser punk, compra chapinha porque agora ter cabelo liso é uma barbada, encontra uma cabeleireira chamada Norma que começa a picotar o cabelo até todos os traumas virem à tona e você chorar até ver que ficou ótimo.

Então, depois de anos de cabelos compridos, toneladas de shampoo, condicionador e creme pra pentear, rabos de cavalo que eram mais compridos do que a fiação elétrica e quase nenhum custo com salão de beleza, eu vi. Eu vi um cabelo tão picotado que parecia mastigado por um cavalo. Eu vi uma franja no olho bem do tipo que cega as meninas desobedientes, ahhh eu vi. E lá fui eu para um desses salões "moderninhos" que cobram quase tão rápido quanto passam a navalha por aquele enorme, comprido e bem tratado cabelo de adolescente.

Nessas horas todo mundo faz igual: fecha os olhos apertado pra não pensar na merda que está fazendo, olha pro chão e tem certeza que o Chewbacca morreu, vive a agonia do erro e imagina todos os meses que ele vai levar pra crescer outra vez. Mas aí acontece uma coisa estranha, você olha no espelho: primeiro em pânico, depois fazendo caretas variadas para testar, dá uma mexida na franja que nunca fica no lugar e descobre que sim, os dias de primo Itt acabaram, que aquele papo de personalidade começou a fazer sentindo e que em certas histórias: o sansão ganha uma força extra quando descobre a tesoura, a cera e um ventinho bem de leve batendo na nuca.

9 comentários:

  1. Esqueceu de falar do eterno rabo-de-cavalo. Mas eu testemunhei o corte que a Norma fez e o choro convulsivo quando a tesoura adentrou as melenas, e testemunhei também quando o choro estancou subitamente quando viu o resultado no espelho meia hora depois de ter cortado. Mas eu pagava uma boiada pra te ver de Juruna...
    Como sempre... um texto debochado, cínico, divertido e que muita guriazinha piolhenta vai se identificar. Fernando Pfeff

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  2. na verdade eu tb sofri essa com essa epidemia do cabelo ''chanel'' que de chanel nao tinha nada.
    Apenas era um corte indefinido acima da orelha para que as nossas mães nao precisassem se preocupar com os piolhos e nem em prender nossos cabelos.

    A sorte é que quando eu era pequena, meu cabelo era liso. e pentear cabelos era para os fracos.

    Hj sou muito feliz com meus cabelos acima dos ombros com aquela boa progressiva. correria.

    Beijos prima, to acompanhando!

    Fuuuuuuuui

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  3. Gamei na pequena Mari, isso sim.

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  4. Divertido pra caralho, como sempre.
    Vou repetir isso várias vezes: quando sair o livro, o prefácio sou eu que escrevo

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  5. Adorei esse post auto-biográfico, realmente o gosto de nossos pais é um baita problema e acaba que muitas vezes as crianças sofrem com esse mal gosto!
    Beijão!

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  6. Estranho que após tanto protesto pelos pobres fios de cabelo encurtados a contragosto, o "happy end" seja protagonizado através da cruel tesoura.

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  7. Nossa, eu já tive o cabelo de tudo quanto é jeito, cor e tamanho. Inclusive o corte Xororó. E adorava!! hahahahahah

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  8. MUITO bom! uashdash!
    "aquele papo de personalidade começou a fazer sentindo" asuihduias

    Eu estudei com uma piolhenta na sexta-série!!!

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  9. olá, somos colegas de blog, gostei de suas postagens depois veja as minhas tbm se puder, OK!

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